sábado, 4 de abril de 2020
"Isto não é uma escola": Do surrealismo de Magritte 3.0 ao imediatismo da Educação Digital em tempos de isolamento social (brevíssima reflexão)
A imagem acima, uma releitura crítica da famosa tela do pintor surrealista René Magritte, encontrei no Facebook do meu amigo e colega Robson Garcia Freire, educador do RJ, residindo atualmente em João Pessoa (PB), Brasil, que tinha achado na página de Guillaume Soulez, e é uma fantástica possibilidade de debater sobre educação formal, educação a distância e a tentativa de educação on-line em tempos de isolamento social.
O termo surrealidade invadiu à própria realidade contemporânea, seja na política, economia e agora na saúde pública, em tempos de pandemia, que traz notícias e imagens que lembram as mais doidas distopias. O mundo parece ter se tornado, em alguns casos, totalmente surreal.
Porém, o que une o surrealismo de Magritte (versão original a seguir), nessa versão 3.0 de sua obra clássica, ao imediatismo de todos quererem fazer educação digital, conectada, mesmo sem muita experiência no ramo, é justamente que, como na famosa tela do artista belga, que dizia que "Isto não é um cachimbo", podemos também refletir sobre a imagem acima, de que um notebook como símbolo dessa conexão entre a escola e seus professores e do outro lado da tela, seus alunos e pais, mediados pelas TIC, mídias e redes sociais, não é de forma alguma uma escola, sob o ponto de vista convencional. É apenas uma representação limitada e parcial do real. E para usar um termo técnico e próprio da informática: trata-se de quando muito, uma simulação de escola, pois é impossível transpor a metodologia e tecnologia utilizada numa sala de aula e na escola como um todo, para um período de confinamento, de restrição de saída às ruas, de falta de convívio social.
Nenhum professor e escola, por melhor que sejam, e estrutura que tenham, poderão dar conta de demandas de alunos que, ainda que tenham já desenvolvido algumas atividades on-line, nunca foi dessa forma, totalmente à distância. Um computador com conexão a internet, por melhor que seja, não é uma escola, nem dará conta de aspectos pedagógicos, didáticos, metodológicos, afetivos e avaliativos do processo pleno de ensino e aprendizagem.
Todos estão se adaptando a uma excepcionalidade, tendo que aprender a dirigir um carro novo em pleno movimento. Educar requer tempo adequado para planejamento, organização de material, troca de saberes etc. Mais que isso, requer experimentação de novas possibilidades com o devido suporte técnico. Requer também conhecimento de edição de vídeos e áudios, que demandam tempo. Tendo como analogia o cinema, pode-se lembrar que um longa-metragem demanda meses para sua gravação e edição, antes de seu lançamento; um curta-metragem de 2 a 5 minutos demora horas ou dias para sua finalização. E isso que, feito por profissionais da área! Como então querer que professores dominem ferramentas, equipamentos, recursos tecnológicos, aplicativos complexos, além do planejamento natural de suas aulas? Há que se repensar toda a prática escolar em tempos de educação fora do espaço convencional. Há que o professor receba capacitação continuada, equipamentos adequados, conexão eficiente e muito mais. E do outro lado da tela pressupor que o aluno disponha também de equipamento e conexão adequadas. E isso, se pensarmos em escolas particulares que tanto a instituição, professores e alunos possuem uma outra realidade, bem diversa da maioria das escolas da rede pública, seus professores e alunado.
Portanto, antes de todo mundo sair por ai fazendo videoaula amadora, no imediatismo exigido pela situação e sua surrealidade; convém, primeiro estimularas trocas de experiências entre os professores, seja por grupo de WhatsApp, emails, "Lives" nas redes sociais digitais. De o professor pensar atividades iniciais mais simples e gradualmente, a medida que irá se familiarizando com alguns recursos, ir incorporando-os ao seu fazer pedagógico; estabelecendo trocas com outros educadores e com o possível suporte da instituição, quando houver.
Eu, comecei de forma gradual: na primeira semana utilizei-me do livro didático, do aplicativo da escola que todos os alunos tinham instalado no celular, do e-mail e do grupo de whats para passar tarefas, de leitura de páginas de conteúdo à resolução de questões; na segunda semana, mandei gabaritos em PDF, mapas mentais e podcasts (arquivos de áudio) para explicar o conteúdo; na terceira, passei a fazer videoaulas em plataforma da escola, com momentos de 20 minutos, usando de forma compartilhada na tela slides, mapas mentais e livro didático junto aos alunos; mais adiante penso em produzir vídeos e disponibilizá-los via YouTube, ou fazer Hangouts (app que se instala no celular e permite videochamada de até 100 pessoas, recursos liberado gratuitamente neste período de pandemia). Apesar de ter longa experiência com educação a distância, sei que meus alunos não possuem isso, então, muita calma nessa hora: QUALIDADE acima da quantidade e bom senso acima do imediatismo e do atropelo.
Que a surrealidade do mundo lá fora, não contagie a educação, pois de fato um computador, por melhor que seja, nunca será o substitutivo pleno para a escola, quando muito um paliativo, e em alguns casos, mera simulação para se tirar uma boa fotografia e expor como novidade e suposta adaptação supersônica à situação excepcional.
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