quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A Escola do Cinema: uma lição de pai para filho (e o festival de cinema familiar)



Fonte: http://veja.abril.com.br/080709/escola-cinema-p-146.shtml

Aprendemos nos locais mais improváveis. Estava recentemente em consultório médico e, enquanto aguardava minha consulta, peguei uma revista antiga, de 2009, e comecei a folhear apenas para passar o tempo, sem maiores expectativas. Mas eis que o imponderável surgiu, e na coluna de livros, vi matéria que me encantou, da experiência entre pai e filho, envolvendo o cinema (imagem acima), que tornou-se o livro O CLUBE DO FILME. Uma grande lição de vida para ambos. Imaginem só, filho que não quer mais estudar e pai aceita isso, desde que ele concorde em assistir a uma série de filmes juntos. Resultado disso: filho retorna aos estudos e ainda torna-se cineasta. Simplesmente fantástico e uma grande lição para educadores entenderam o mundo do alunado, tentando outras formas de interação ao ato de educar, não tão formal, mas mais casual, buscando novas metodologias para sua didática.
Sempre digo aos cursistas e colegas que muitas vezes temos que atravessar fronteiras. Trazer os alunos para "Em algum lugar do passado", e também dar oportunidades para que eles nos conduzam "De volta para o futuro".
Educar é dialogar...

Veja abaixo a íntegra da experiência que uniu pai e filho, e que serve de motivação para outros pais e educadores interagirem com filhos e alunos. Os destaques em negrito, foram feitos por mim:

Vide artigo abaixo:

A ESCOLA DO CINEMA, por Isabela Boscov, para Revista Veja (edição 2120, de 08/07/2009):

O "CLUBE" ACABOU, A UNIÃO RESISTE
Gilmour e Jesse, que voltou a estudar e tenta ser cineasta: uma saída desesperada que virou uma porta de entrada

O escritor David Gilmour deixou seu filho largar os estudos quando
ele tinha 15 anos. Com uma condição: ver os filmes que o pai
escolhesse. Foi de fato um aprendizado - para ambos.

Quando seu filho Jesse tinha 15 anos, o escritor canadense David Gilmour fez o que poucos pais arriscariam fazer: em face da infelicidade do menino com a vida escolar, permitiu que ele deixasse os estudos. Mas impôs uma condição. Toda semana, Jesse deveria assistir a três filmes que seu pai escolhesse. Os Incompreendidos, de François Truffaut, inaugurou a seleção. A juventude do cineasta havia sido árdua: mal-amado pelos pais, ele fora delinquente até encontrar no cinema, primeiro como crítico e depois como diretor, uma vocação. Na última cena de Os Incompreendidos, seu protagonista - e alter ego - foge do reformatório, vaga até uma praia deserta e então olha para a câmera, que congela a imagem. Jesse não chegou a vibrar (Instinto Selvagem, mostrado a seguir, despertou mais entusiasmo), mas gostou o suficiente para o pai cutucá-lo: o que significava aquele desfecho?

Jesse formulou uma interpretação: o personagem estava se dando conta de que se livrar das coisas que lhe desagradavam fora fácil. Agora vinha a parte difícil - encontrar um rumo. Não é simples para um adolescente articular sua perplexidade. Os Incompreendidos, porém, além de ser um grande filme, deu a Jesse uma imagem de sua confusão e uma deixa para desabafar. Episódios como esse são o fio condutor de O Clube do Filme (Intrínseca; tradução de Luciano Trigo; 240 páginas; 24,90 reais), sobre os três anos de cinefilia compartilhados por pai e filho (...). O relato evoca não apenas as dores por que passam pais e filhos, mas também aquele fenômeno meio mágico que às vezes se dá numa sala escura, diante de uma tela: uma descoberta e uma comunhão que, exatamente por prescindirem de palavras, ultrapassam o que se pode dizer.

Trocar a instrução formal pelo cinema foi uma proposta surgida do desespero. Gilmour a adotou porque o ódio à escola estava envenenando o filho e porque ver filmes lhe pareceu ser o meio mais seguro de garantir que eles tivessem uma proximidade franca e frutífera. "Mas perdi a conta de quantas vezes acordei de madrugada com o pavor de destruir o futuro do meu filho", disse ele a VEJA. O medo de que nem a alternativa da educação pelo cinema funcionasse inspirou uma série de precauções. Para que as sessões não ganhassem ar de obrigação nem terminassem por fazer de Jesse um esnobe, Gilmour tomou uma decisão brilhante: repudiou qualquer método. Filmes célebres ou obscuros, bons ou ruins, recentes ou antigos, americanos ou de qualquer outra procedência se sucederam no aparelho de DVD conforme o pai, crítico de cinema bissexto, se lembrava deles, ou conforme o humor do adolescente o determinasse. Quando Jesse caiu em tristeza profunda por causa de uma namorada, fez-se um pequeno ciclo de terror: nada como uma emoção forte para ajudar a esquecer outra.

Outra medida lúcida foi a de evitar preleções. O pai dava algumas dicas sobre o que se iria ver e cerrava os dentes para não falar além da conta. Os filmes é que deveriam falar por si mesmos, e então seria a vez de Jesse falar - ou não - sobre eles. De alguns dos títulos, ele tirou lições diretas (veja o quadro); outros o inspiraram de maneiras sutis. Jesse, hoje com 23 anos, retornou de livre vontade aos estudos, já rodou um curta-metragem, no qual também atuou, e prepara o roteiro de um longa. Sua inspiração foi Woody Allen, o cineasta com quem mais se identificou durante o aprendizado e por meio do qual identificou em si o desejo de escrever bem.

A educação heterodoxa de Jesse nesses anos recupera um tipo de convivência que se tornou raro: aquele em que pessoas se reúnem em torno de um interesse. Dos tempos pré-históricos, em que os mitos eram transmitidos de geração para geração à volta da fogueira, até o início do século XX, em que pais e filhos se juntavam para ouvir um deles ler um romance ou acompanhar uma história pelo rádio, essa é uma forma primordial de lazer - além de uma necessidade evolutiva. Nesses momentos, os mais velhos ensinam o que podem aos mais jovens e aprendem algo novo com eles; os laços se estreitam e os horizontes, por sua vez, se expandem. A vida afobada de hoje tende a limitar tais oportunidades. Nesse sentido, O Clube do Filme é um grande lembrete: os filmes, sejam eles bons ou ruins, representam o acúmulo da experiência humana da mesma forma que a literatura, a história ou a filosofia. Com a vantagem de que mesmo os adolescentes mais arredios (ou especialmente estes) adoram assistir a eles. Alguns gostam tanto que se dispõem até a conversar sobre eles. E outros ainda, como Jesse, descobrem nessa saída formulada por um pai que não sabe mais o que fazer exatamente aquilo que lhes faltava: uma porta de entrada.

Fonte: http://veja.abril.com.br/080709/escola-cinema-p-146.shtml

Revista Veja, Edição 2120 / 8 de julho de 2009.

Após ler o texto acima, cada vez mais chego a conclusão de que Arte e Cultura são alguns destes caminhos de interação com uma geração audiovisual...

2 comentários:

  1. Olá...
    Gaostaria de encontrar este texto do professor José Henrique,conto com sua ajuda. Já encomendei o livro. Sou doutoranda em educação e estudo cinema.
    Att,
    Emília

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  2. Oi, Emília... O Texto de José Henrique Freitas é o que transcrevi em itálico, aqui no Educa Tube, mas podes fazer contato com o próprio, clicando sobre o nome dele, que é link para seu perfil no Facebook. Bom estudo, abraços.

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