domingo, 10 de março de 2013

Aprendendo com um movimento pés-descalços, por Bunker Roy (TED)



O vídeo acima, Aprendendo com um movimento pés-descalços, descobri no You Tube e trata-se de palestra de Bunker Roy ao TED, sobre a Universidade dos Pés-Descalços, que foi idealizada e fundada por ele, décadas atrás, em Rajasthan, na Índia, "uma escola extraordinária ensina mulheres e homens do meio rural - muitos deles analfabetos - a tornarem-se engenheiros solares, artesãos, dentistas e médicos nas suas próprias aldeias."
Depoimento de quem teve uma educação elitista e largou tudo para se dedicar a um projeto de trabalho que é extensão do projeto maior de vida, de fazer o bem comum aos mais necessitados. Nem apologia nem ideologia, uma filosofia de vida de quem frequentou escolas e universidades mais caras da Índia.
Bunker Roy diz que descobriu "os mais extraordinários conhecimentos e habilidades que as pessoas muito pobres têm, que nunca são trazidos ao conhecimento público, que nunca são identificados, respeitados, aplicados em larga escala" e ai pensou em fundar a Universidade dos Pés-Descalços, uma universidade só para os pobres, resgatando e sistematizando este conhecimento popular, e passando a visitar as aldeias mais pobres da Índia.
Pensando nas palavras de Roy, penso que muitos sistemas de ensino são inspirados em sistemas de ensino considerados modelo, de Primeiro Mundo, mas que nem sempre são adaptados à realidade local, simplesmente transplantando, como uma metáfora, um tipo de palmeira que sobrevive melhor numa região para um deserto... Em uma aldeia, o conselho de anciões sugeriu que Roy não trouxesse nenhum acadêmico para a Universidade, se queria mesmo que seu objetivo fosse alcançado, e assim o fez... Na UPE (sigla que utilizo para mencionar a entidade) é preciso saber trabalhar com as mãos, ter a praticidade das coisas. Que seja um trabalho prestado à comunidade. Na verdade, parece-me uma escola de ensino profissionalizante com sentido social e comunitário. E estes profissionais são parteira, oleiro, agricultor, artesão etc.
Fica claro que objetivo da UPE é organizar este conhecimento e difundir, pois estamos justamente entrando em nova revolução tecnológica e muitas das profissões - sapateiro, alfaiate, engraxate etc - estão sendo extintas, diante da massificação dos produtos e das linhas de produção, cada vez mais substituindo pessoas por robôs. Muito conhecimento como o de fazer brinquedos com sucata foi quase perdido e é totalmente desconhecido da atual geração que nasceu sob o impacto dos eletroeletrônicos.
Divulgar, sistematizar e valorizar este conhecimento e habilidades dos mais humildes, que é algo universal, a partir de questões puramente locais.
Quando divulguei o referido vídeo nas redes sociais, uma colega e amiga me perguntou se não considerava a proposta "uma apologia da não-escolarização e a negação do conhecimento humano sistematizado pelos séculos". Revendo o vídeo, penso não se tratar nem de apologia nem de ideologia, mas de uma filosofia de vida e de trabalho em comunidade. Trata-se do resgate de práticas milenares e justamente sua sistematização, ainda que sem a preocupação formal da certificação, da validação oficial de estudos, ou seja, das práticas convencionais de educação, hoje muito calcadas em aumentar o currículo vitae, para competir com o mercado cada vez mais individualista.
Universidade esta que funciona a partir do estilo de vida e de trabalho de Mahatma Gandhi, que disse certa vez: "Seja a mudança que desejas para o mundo". Não há contratos e ninguém recebe mais de 100 dólares por mês.
Outro objetivo é de que as pessoas venham para criar e experimentar ideias, por mais malucas que sejam. O empirismo, a praticidade. Como disse Bunker Roy: "O Liceu Pés-Descalços é o único liceu onde o professor é o aprendiz e o aprendiz é o professor."
Não é conferido certificado, a construção da escola foi feita por seus integrantes, através do conhecimento prático de cada um; toda energia é solar, através da captação feita por painéis instalados no telhado pelas mulheres das comunidades, de forma autodidata. A água é coletada da chuva através da canalização pelo telhado. Há escolas noturnas por que lá as crianças trabalham de dia e estudam à noite.
Enfim, os maiores objetivos da UPE são os trabalhos manuais e os conhecimentos práticos DO e PARA o dia a dia em comunidade, socializando saberes em prol de todos, sem fins lucrativos, preservando este conhecimento em tempos de tecnologia de ponta e consumismo, individualismo e tudo mais. E o mais interessante de tal projeto de vida e de trabalho, idealizado por Bunker Roy é que a cada 5 anos é eleito um primeiro-ministro que escolhe o seu ministério e efetivamente acompanha o que acontece em 150 escolas destas aldeias, com um público-alvo de 7 mil crianças.

2 comentários:

  1. Estou fazendo uma pesquisa para a Faculdade sobre a Universidade Pés-descalços, e não achei melhor explicação que essa! É possível enxergar a verdadeira natureza e propósito do projeto! Fantástico!
    Obrigada

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    1. Grato, Nath. Fico feliz em poder contribuir. Sucesso no trabalho e curso. Um abraço, Zé Roig.

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